segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Kaos e outros contos sicilianos (1910-20) 
Luigi Pirandello (1867-1936) - Itália         
Tradução: Fúlvia M. L. Moretto        
São Paulo: Nova Alexandria, 2001, 128 páginas  


Esta coletânea reúne sete contos que, tendo como cenário comum a Sicília, terra-natal de Pirandello, evidenciam à perfeição a visão extremamente pessimista do autor em relação à Humanidade, ao mesmo tempo em que expõem seu olhar solidário para com os indivíduos, vítimas do destino implacavelmente cruel. Aqui nos deparamos com algumas narrativas magistrais: a mãe que na miséria recusa qualquer ajuda ou contato com um filho bom e dedicado, porque ele é a cara do pai, um monstro que assassinou seu marido e a estuprou ("O outro filho"); traído, Bruno Celesia é ridicularizado por toda a cidade, e no único ato heróico que comete em toda a sua vida, salva, sem querer, o amante da mulher ("Ao valor civil"); viúva ainda jovem, Adriana Braggi compreende que jogou fora sua existência no momento em que já não resta mais nada a fazer ("A viagem"). Destaque ainda para os "Colóquios com os personagens", magníficos exercícios de autorreflexão sobre a importância da arte, principalmente em momentos em que tudo parece perder o sentido (no caso, a carnificina da I Guerra Mundial). Mesmo quando se limitam a simples anedotas, como em "A bilha", "Requiem" e "A morta e a viva", os relatos são tão bem construídos que ultrapassam o que vai escrito: não lidamos com personagens, mas com extratos da vida.


Avaliação: OBRA-PRIMA  

(Novembro, 2015)


Entre aspas

"(...) as mulheres, nas quais desde a infância esterilizava-se obrigatoriamente qualquer instinto de vaidade, casadas sem amor, depois de se terem ocupadas como empregadas com os afazeres domésticos, sempre os mesmos, definhavam miseravelmente com uma criança no colo ou com o terço na mão à espera que o homem, o patrão, voltasse para casa". (p. 93)

 "(...) a vida (...) nós a damos aos filhos para que sejam eles a vivê-la e nos contentamos se algum reflexo chega até nós; mas não nos parece mais a nossa; a nossa, para nós, aqui dentro, permanece sempre aquela que não demos mas que, por nossa vez, nos foi dada; aquela que, por mais que se alongue no tempo, conserva sempre dentro de si o primeiro sabor de infância e o rosto e os cuidados de nossa mãe e de nosso pai e a casa de antigamente como a haviam feito para nós... Você pode sabê-lo como foi aquela minha vida porque tantas vezes lhe falei dela; mas viver uma vida (...) é outra coisa..." (p. 121)

"Agora que você está morta, não digo que não esteja mais viva para mim; você está viva, viva como você era, com a mesma realidade que por tantos anos eu, de longe, lhe dei, pensando em você, sem ver seu corpo, e você estará sempre viva enquanto eu for vivo; mas (...) eu agora não estou mais vivo e nunca mais estarei vivo para você! Porque você não pode mais pensar em mim como eu penso em você, você não pode mais sentir-me como eu a sinto! E é exatamente isso, mamãe, exatamente por isso que aqueles que se julgam vivos julgam também estar chorando seus mortos e pelo contrário choram sua própria morte, uma própria realidade que não mais se encontra no sentimento daqueles que partiram." (p. 127)

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