Memórias póstumas de Brás Cubas (1881)
Machado de Assis (1839-1908) - Brasil
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: MEC, 1975, 301 páginas
Um dos
melhores romances da literatura ocidental, “(...) livro escrito com pachorra,
(...) que não edifica nem destrói, não inflama nem regela (...) mais que
passatempo e menos do que apostolado” (p. 104). Morto, Brás Cubas pode
mostrar-se como é, sem receio do julgamento de seus pares: egoísta, interesseiro,
parasita social que usufrui da fortuna deixada pelo pai. Se do ponto de vista formal
é inovador e moderno – basta observar, por exemplo, os
capítulos VI (O delírio), digno de figurar nas melhores antologias fantásticas;
o magnífico LV (O velho diálogo de Adão e Eva), inteiro construído com interrogações,
exclamações e reticências; o CXXXIX (De como não fui ministro de Estado), feito
somente com reticências, pois “há coisas que melhor se dizem calando” (p.281) – não o é
menos na introdução de novas temáticas no horizonte da ficção nacional. Escrito
com “a pena da galhofa e a tinta da melancolia” (p. 97), é irônico, pessimista,
cruel – observe,
entre outros, os capítulos XXI (O almocreve), o XLVI (A herança), o LXVIII (O
vergalho) e o LXXV (Comigo). Interessante também notar que destas Memórias
surgem algumas sugestões para textos posteriores, particularmente o romance Quincas Borba (1892)*.
* É aqui que surge o personagem e aqui também que é exposta sua filosofia, o Humanitismo (cap. CXVII).
Avaliação: OBRA-PRIMA
(Janeiro, 2016)
PRIMEIRO PARÁGRAFO
“Que
Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, coisa é
que admira e consterna. O que não admira nem provavelmente consternará é se
este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinquenta, nem
vinte, e quando muito, dez. Dez? Talvez cinco. Trata-se, na verdade, de uma
obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de um Sterne, ou
de um Xavier de Maistre, não sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo.
Pode ser. Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da
melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio. Acresce que
a gente grave achará no livro umas aparências de puro romance, ao passo que a
gente frívola não achará nele o seu romance usual; ei-lo aí fica privado da estima
dos graves e do amor dos frívolos, que são as duas colunas máximas da opinião".
ÚLTIMO PARÁGRAFO
“Este
último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplasto,
não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao
lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do
meu rosto. Mais; não padeci a morte de Dona Plácida, nem a semi-demência do
Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não
houve míngua nem sobra, e conseguintemente que saí quite com a vida. E
imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um
pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: - Não tive
filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”.
Entre aspas
“Não
importa ao tempo o minuto que passa, mas o minuto que vem. O minuto que vem é
forte, jocundo, supõe trazer em si a eternidade, e traz a morte, e perece como
o outro, mas o tempo subsiste”. (p. 111)
“Marcela
amou-me durante quinze meses e onze contos de réis, nada menos”. (p. 132)
“Deixa
lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não é; é uma errata pensante,
isso sim. Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será
corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes”
(p. 152)
“A
velhice ridícula é, porventura, a mais triste e derradeira surpresa da natureza
humana (p. 222)
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