terça-feira, 29 de novembro de 2016

Memórias de um morto (1918
Hjalmar Bergman (1883-1931) - Suécia         
Tradução: João Reis       
Vila Nova de Gaia: Eucleia, 2011,326 páginas



Trata-se de um romance bastante desigual: o primeiro bloco, que ocupa cerca de 2/3 do livro, é muito bom e funciona como unidade autônoma; o segundo, no entanto, é confuso e inverossímil. A primeira parte, da página 10 a 178, compreende a infância do protagonista, Jan Arnberg, com uma introdução (os dois primeiros capítulos) sobre a origem obscura da família Arnberg (que tinha sido Fält, depois Fältman), envolvendo roubo e assassinato, e que, mais tarde, iria se orgulhar de contar com um bispo (Julius), médicos e advogados. Narrado em primeira pessoa, Jan acompanha as notícias de seu pai, Johann, aventurando-se nos Estados Unidos e ganhando e perdendo dinheiro com um remédio "milagroso" contra tuberculose, e, depois, com a morte de sua mãe, a volta para W., interior da Suécia, onde mantém relações conturbadas com o sogro, o bispo Julius, inflexível em suas predições morais, e com cunhados e concunhados. Johann casa-se em  segundas núpcias com Hedda, com quem já tinha uma filha, Anna, vivendo todos em uma situação de quase miséria, o pai a perseguir invenções inexequíveis. A repetição do destino das personagens - que morrem de tuberculose ou vitimados pelo álcool - e o clima meio onírico no qual a história transcorre faz com que nos lembremos - a angústia da influência - do colombiano Gabriel García Márquez (1927-2014): poderíamos até mesmo afirmar que Memórias de um morto seria assim uma espécie de Cem anos de solidão protestante. Como exemplo, leiamos o que se segue: : "(...) sofria pelos pecados de seus antepassados, e (...) o seu castigo e também da família, era o de que o mesmo crime tinha de ser perpetuado geração após geração" (pág. 282) ou "Nós, Arnbergs, tornamo-nos ou pecadores ou fantasmas" (pág. 200). Mas, se nessas páginas iniciais há um clima mágico que dá sentido à narrativa, o segundo bloco, que transcorre em Hamburgo, Alemanha, uns 15 anos mais tarde, é recheado de coincidências gratuitas e revelações inexplicáveis que embaralham-se, tornando a história complicada e não complexa. Uma pena, porque a ideia de que Jan, antes mesmo de morrer já está morto, materializada nesta excelente imagem, "O relógio do pai perdeu os ponteiros. Os números estão lá, e o mecanismo faz tique-taque, mas não sei é de manhã ou de tarde, dia ou noite" (pág. 264), não sustenta a pretendida unidade do livro. 


Avaliação: BOM  

(Novembro, 2016)


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