segunda-feira, 3 de julho de 2017

Cavalo pálido, pálido cavaleiro (1939) 
Katherine Anne Porter (1890-1980) - EUA    
Lisboa: Antígona, 2014, 252 páginas
Tradução: Paulo Faria   




Este livro reúne três contos longos. O primeiro, "Velha mortalidade", é um exemplo de excelência da arte ficcional. Dividido em três partes, que cobrem os anos de 1895-1902, 1904 e 1912, a autora vai construindo e desconstruindo o retrato de uma personagem fugidia, Amy, que não aparece diretamente na história, mas somente por meio de frases e situações referidas pelos outros personagens. Quando se inicia a narrativa, Amy já é apenas uma fotografia de uma extravagante tia morta há muitos anos - e, no final, o que permanece é a imagem de uma mulher complexa, amada, invejada, inapreensível. O segundo conto, "O vinho do meio-dia", tem como cenário "uma pequena quinta no sul do Texas", entre 1896 e 1905 (a Autora adora datar com exatidão o tempo de suas narrativas). Um dia, Olaf Helton, um imigrante sueco, aparece nas terras dos Thompson oferecendo-se para trabalhar. Embora calado e introvertido, conquista o respeito e a admiração da família. Muitos anos se passam, até que surge na fazenda Mr. Hatch, um homem especializado em localizar e aprisionar loucos fugidos de hospícios em troca de dinheiro. Tentando proteger Mr. Helton, Mr. Thompson mata acidentalmente Mr. Hatch, enquanto Mr. Helton, buscando escapar, é assassinado pela turba enfurecida. Mr. Thompson é julgado e absolvido, mas acaba se suicidando, premido pela culpa e pela vergonha. O último conto, que dá título ao livro, se passa numa "cidade do Oeste" dos Estados Unidos, em plena Primeira Guerra Mundial. Miranda é uma jovem jornalista que conhece Adam, soldado que se prepara para ir lutar na Europa. Eles se apaixonam e sonham em viver juntos no futuro, em um mundo onde "não vai tornar a haver guerras" (p. 185). Miranda, no entanto, adoece com a gripe espanhola e perde o contato com Adam. Após se recuperar, recebe a notícia de que ele morrera da mesma doença no hospital da base para onde fora deslocado. Uma história tristíssima de descoberta da finitude, mas também de esperança. O que mais ressalta é a incrível capacidade da Autora de transitar por mundos completamente diferentes: o universo de classe média alta em "Velha mortalidade", a vida rural próxima da penúria em "O vinho do meio-dia", a difícil luta pela sobrevivência de uma jovem em início de carreira em "Cavalo pálido, pálido cavaleiro". Um livro soberbo!


(Julho, 2017)



Avaliação: OBRA-PRIMA


Entre aspas:




"(...) não nos atrevemos a dizer uns aos outros uma palavra que seja acerca do nosso desespero, somos animais mudos e deixamos que nos destruam". (pág. 201)


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